quinta-feira, 20 de agosto de 2009

O Alto Mago - conto 1

Já havia passado da metade de Ches. O inverno de despedira deixando livre o caminho para a doce primavera. Logo depois do meio-dia, a alguns dias de distância da magnífica Pedra do Acordo. Quase no coração da misteriosa floresta de Cormantor, um elfo vestindo um manto branco colocava uma última pedra sobre o que parecia um túmulo ao lado de outro túmulo também de pedras. O elfo do sol tentava esconder o rosto com o capuz do manto. Mas a recém chegada brisa da primavera fez com que seu rosto aparecesse. O seu semblante era de alguém que havia perdido algo muito importante. A brisa tocou seus lisos cabelos loiros fazendo eles tremularem suavemente. Ele levantou-se e tentou conter suas lágrimas inutilmente. Seus olhos verdes lacrimejaram e a floresta ficou silenciosa com seu pesar. O elfo fechou os olhos, suspirou e começou a conversar com as pedras como se estivesse falando com quem estava embaixo delas.
- Você foi corajoso... Não era um irmão de sangue, mas certamente merecia o amor dela... Gostaria de ter conversado com você mais uma vez. Mas o destino nos impediu... Realmente, uma lástima... Já fazia tempo que a minha querida irmã havia partido, mas um abençoado sacerdote de Corellon me disse que o local de descanso dela havia sido profanado. E foi por isso que saí de Evereska. Ainda lembro como se fosse há alguns dias. Permita que eu lhe conte.
O elfo se sentou na frente dos dois túmulos e começou a contar o que desejava.


Era uma noite gelada de lua cheia no inverno. Tudo o que ocupava a minha mente era o fato de que o túmulo de Kethari havia sido profanado. A minha alma sentia ódio, pois a necromancia é uma ferramenta suja e foi com esse instrumento pútrido que a minha irmã fora acordada de seu descanso. Utilizando-me da mais refinada arte que aprendi, surgi aqui mesmo e vi apenas um buraco no chão. Um orifício pequeno nesse solo sagrado comparado ao vazio que aquilo havia me causado. Naquela noite eu caí de joelhos chorando e pedi perdão a Corellon por eu não ter tido a capacidade de prever que alguém tinha a audácia de fazer algo parecido.
Mas a noite gélida guardava mais uma surpresa para mim. Algo imperceptível até mesmo para os de meu povo aproximava-se. A maldita Araushnee enviara seus lacaios para me destruir. Levantei com os olhos fechados e permaneci imóvel. Seus passos faziam um gato parecer uma criatura desajeitada. Era impossível ouvir eles. Mas a arte me ensinou a ver e escutar com a alma. Eles estavam em trio. A que parecia ser a líder deles estava mais distante aproximando-se pela minha frente, andando no ar, sussurrando e fazendo gestos para ganhar as graças da senhora das aranhas. Era uma drow que não tinha cabelos e trajava um manto negro. O que me flanqueava pela esquerda já estava com uma adaga em cada mão preparada para atacar a qualquer momento, um drow assassino bem treinado e usando uma armadura leve de couro negro. No flanco direito, eu estava na mira de um arco. Uma flecha negra com a aura daquilo que eu mais abominava, necromancia. O arqueiro estava mirando na minha nuca, sua postura era firme e decidida e usava uma armadura semelhante à do assassino da esquerda. Eu me perguntava... Quantos irmãos e irmãs deveriam ter caído diante de uma equipe tão mortífera?
A noite não era tão escura por causa da lua, mas se tornou um breu total quando a sacerdotisa de Araushnee terminou seus gestos. A flecha negra sibilou no ar em minha direção, disparada pelo arqueiro que ignorou o escuro. Ela bateu em minhas costas sem perfurar minha pele que enrijeci através da arte. Eu sorri quando percebi que o assassino se surpreendera por não conseguir aproximar-se de mim.
Cansado das tolices daqueles patéticos elfos negros, virei de lado para a clériga. Sua expressão era algo sublime para um filho de Corellon. Ela sentiu tanto medo quanto um filhote encurralado. Sem sussurrar uma única palavra e apenas gesticulando apontei meu cajado negro com a mão esquerda em sua direção. A esfera de energia disparada da ponta do cajado não brilhou dentro das trevas, mas assim que saiu, atingiu a drow em cheio. Ela não conseguiu nem gritar com a dor que sentiu. Num gesto acelerado, apontei o indicador direito na direção do arqueiro. Uma esfera elétrica cintilou a partir de seus pés consumindo seu corpo por inteiro.
Que as forças do bem me perdoem por ter sentido prazer naquele momento.
O assassino fugiu com todas as suas forças correndo desesperadamente. A arte me colocou há alguns metros na sua frente. Num gesto rápido, ele fez com que surgissem instantaneamente inúmeras teias. Eu estava completamente harmonizado com a arte e os incontáveis fios tecidos pelo fraco poder drow do assassino nem sequer tocaram em mim. Eu apontei o cajado para ele. O drow não conseguiu mais se mover e sussurrou.
- Mate-me agora! Logo, muito mais de nós surgirão aqui! Quanto tempo você acha que pode sobreviver?!
Eu dei um passo a frente.
- Apenas diga quem profanou o túmulo de minha irmã.
Ele começou a rir.
- Logo você será comida de aranha! Eu não vou lhe dizer nada!
Num gesto simples, pedi emprestada à arte o poder de iludir. E em poucos segundos, o drow assassino estava vendo seu pior pesadelo. Ele chorou e gritou.
- Mestre Dragster! Ajude-me! Não permita que...
Os olhos do drow arregalaram-se, eu não sentia mais sua respiração. Levantei o cajado e o corpo dele caiu ao chão sem vida.
Caminhei pela noite perguntando a lua onde um elfo negro poderia se esconder com uma morta-viva recém animada. Certamente ele não estaria nos domínios drow. Não haveria propósito algum em animar um morto-vivo apenas para voltar para casa. Parei olhando para a lua e minha intuição começou a me guiar em direção aos povoados humanos em volta da Pedra do Acordo... Os Vales reservavam mais surpresas, mas a Alta Magia guardava um presente especial para Dragster... Não faltava muito...



Autor Gustavo Laavian

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